Não podemos negar a relevância da automação robótica de processos (RPA) possibilitando ganhos de produtividade e eficiência com menor complexidade e prazo de desenvolvimento comparado às soluções estruturais típicas em sistemas. Talvez, seja a primeira vez que ferramentas Low Code dão às áreas de negócios um meio de contornar os protocolos tradicionais de TI para corrigir e digitalizar tarefas e processos inteiros de forma ágil e menos invasiva.
Mas, uma triste verdade em torno dos primeiros anos de adoção do RPA, é que muitas organizações e seus respectivos processos, junto das estruturas estabelecidas de governança, não estavam preparados para o início da jornada e muito menos para utilização em escala. Isso gerou grande percepção de retrabalho e decepção e desmotivação para as partes envolvidas em torno dos reais ganhos que o RPA deveria trazer.
“Muitas iniciativas de RPA falharam por terem sido tratadas como algo acessório: um entretenimento corporativo”
O sucesso e a longevidade da RPA nos próximos anos depende da tecnologia se tornar parte da agenda estratégica de transformação digital corporativa e da arquitetura digital emergente. Sem uma força de trabalho digital, muitas empresas deixarão de atender às necessidades digitais de seus clientes, funcionários e fornecedores, e os recursos de RPA para dar suporte a essas transformações fundamentais de processos são de extrema importância, principalmente para empresas tradicionais que buscam maior densidade digital.
A Horses for Sources, blog independente referência em tecnologia, publicou uma revisão do Manifesto da Automação de Processos em 2019. Esse documento, por muitos desconhecido, consolida uma visão interessante sobre como garantir o sucesso e o crescimento dessa tecnologia no mercado. Assim, repasso os 10 pontos do manifesto, com uma adaptação livre para o contexto do Brasil e com algumas reflexões e entendimentos sobre cada um dos tópicos.
1. TI e negócios devem trabalhar juntos e compartilhar a responsabilidade de digitalizar processos ou os modelos de negócios digitais provavelmente falharão.
Em suma, esta é a primeira vez que muitos executivos de operações se interessam por soluções low-code para melhorar os fluxos de processos e a TI é um parceiro fundamental para que isso funcione a longo prazo. As duas áreas não podem ter sucesso uma sem a outra. É preciso compartilhar e acordar um roteiro e um modelo operacional para a automação inteligente para que fluxos de processos suportem os principais resultados de negócios e sejam pensados para automatização.
As áreas de negócios geralmente adoram o RPA, mas a área TI geralmente entende mal essa tecnologia pois ela não se encaixa na lógica da TI. As unidades de negócios devem lembrar que TI tem responsabilidades muito além dos processos de negócios, incluindo segurança e resiliência. Além disso, a TI geralmente carrega o peso da sustentação das automações que requerem um alto grau de intervenção. Estabelecer uma visão, um modelo e uma visão integrados é fator crítico de sucesso.
2. O respeito mútuo entre TI e área de negócios aumenta enormemente as chances de sucesso.
Se um lado não estiver pronto para a mudança, nunca haverá o equilíbrio necessário para que a iniciativa tenha sucesso. Essa maturidade é essencial para combinar o risco e determinar os processos elegíveis.
Idealmente, a área de TI deve estar aberta o suficiente para aceitar que seus colegas de negócios possam trabalhar de maneira diferente, e suas incursões em RPA deverão ser suportadas da melhor forma. Por outro lado, é necessário entender o impacto do RPA para a área de TI e alinhar estrutura, processos, tecnologias e metodologias para que essa frente não seja somente um elemento de desgaste.
3. A automação deve ser pensada dentro de um contexto de estratégia digital.
Se a automação não fizer parte da estratégia geral de negócios e se as métricas de sucesso não estiverem definidas, a liderança não se concentrará na entrega de projetos de automação devido ao risco de falha ou retrabalho no curto prazo. A maioria das empresas só pode entregar três ou quatro iniciativas estratégicas por vez, portanto, devem interromper qualquer projeto de automação que não esteja contribuindo diretamente para uma delas. É necessário pensar o RPA como uma alavanca de crescimento, redução de custos ou digitalização, com patrocínio nas respectivas esferas necessárias.
4. Tratar o RPA como um software corporativo.
Se você vê o RPA como um widget ou utilitário de produtividade, ele não tem chance de dar suporte a mudanças digitais mais amplas. Parte do alinhamento de negócios e TI é reconhecer a RPA como parte do cânone de agentes de mudança digital que estão ajudando a avançar na forma como as empresas são administradas. Nenhuma ferramenta sozinha pode fazer o trabalho, mas o poder exponencial do “e” é convincente.
5. Estabelecer KPIs significativos e mensuráveis.
As melhores medidas de valor incluem quantas horas as automações economizaram e sua contribuição para a eficiência operacional, crescimento, melhoria do atendimento de clientes e envolvimento dos funcionários. Em última análise, muitas empresas medirão iniciativas bem-sucedidas com o número de FTEs, mas pode levar algum tempo para que os soft savings se tornem hard savings à medida que as empresas aprendam e escalem a iniciativa.
“O custo de oportunidade, muitas vezes desconsiderado, pode ser um aliado nessa discussão sobre ganhos: e se não tivéssemos feito nada?”
6. Tratar o RPA como uma espinha dorsal para adoção de outras tecnologias
Para muitas organizações a tecnologia de RPA tem o potencial de fornecer o primeiro conjunto de ferramentas e o caminho para a adoção do uso de dados, inteligência artificial (IA) e Process Mining.
Os trabalhadores digitais inicialmente são direcionados para realizar atividades de baixo valor agregado, repetitivas e pouco inteligentes, mas as plataformas de mercado podem e devem desbloquear valor novo através de robôs mais complexos e que criam mais inteligência para os negócios.
“Pensar os processos além do básico possibilita que os robôs não façam mais do mesmo, que não sejam invisíveis, focados somente em ganho de tempo e potencialmente substituíveis em um curto espaço de tempo: Save the Robots!”
7. A automação deve orquestrar processos ponta a ponta tanto no front office quanto no back office.
Novas pesquisas mostram claramente que a maior parte dos investimentos em automação foi investida em atividades e processos no back office das empresas, principalmente para melhorar os processos financeiros e de TI, como foco em redução de custos. O RPA pode fornecer recursos para unir aplicações legadas, atividades, sistemas, documentos e pessoas em processos internos, de suporte ou orientados a clientes. Naturalmente, isso exige que a liderança da empresa não pense que os robôs devam ser departamentalizados assim como as áreas da sua organização
8. Formar novos talentos e criar novas perspectivas para o mercado de automação.
Geralmente não temos consciência de nossos próprios preconceitos. Apesar do grito de guerra para impulsionar a mudança, muitas operações de negócios e líderes de TI procuram maneiras de fazer as mesmas coisas de forma mais rápida e barata, utilizando as mesmas estruturas centralizadas e perfis de profissionais para automação de processos.
Devemos aumentar a conscientização e cultivar novos talentos por meio de escolas e universidades, requalificar trabalhadores de todas as idades e habilidades e, em geral, nos esforçar para trazer novas experiências e talentos o jogo do RPA. A diversidade e as novas perspectivas são comprovadamente capazes de impulsionar a mudança escalar a tecnologia, mudando o mercado.
9. Não esquecer dos corações e mentes.
A RPA facilita a criação de uma força de trabalho habilitada para o digital que concentra e aprimora as habilidades e capacidades humanas da força de trabalho analógica. O RPA faz isso colocando tarefas repetitivas fora da rotina das pessoas, o que resulta em um trabalho mais gratificante, ou criando acesso em tempo real substancialmente aprimorado a dados ou habilidades computacionais que aumentam a produtividade e a qualidade dos resultados. Use o RPA para empoderar a força de trabalho e ter ganhos em escala.
10. Considerar retirar a palavra “robótica” do RPA.
Não há dúvida de que o termo “robô” foi o catalisador para gerar um interesse sem precedentes no RPA desde seu início em 2012. No entanto, essa simples palavra está profundamente associada à eliminação de empregos através de uma abordagem competitiva.
Assim, esses dez pontos revisitados e adaptados são elementos importantes que devem constar na agenda de líderes que adotam ou querem adotar a automação de processos. O RPA estará em maus lençóis a menos que os líderes de negócios alinhem essa tecnologia com sua agenda mais ampla de transformação digital, assim como as empresas e o ecossistema de RPA devem tratar esse tema como algo maior, parte de uma visão de transformação de processos, pessoas e negócios.
Gilberto Strafacci Neto
Country Manager da Practia no Brasil (www.practiaglobal.com.br) e Senior Partner do Setec Consulting Group (www.setecnet.com.br). Master Business Essentials CORe Program pela Harvard Business School, MBA em Liderança e Inovação, Engenheiro Mecânico pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, Master Black Belt, Agile Coach, Design Thinker, Manager 3.0, Certified Six Sigma Master Black Belt pela American Society for Quality (ASQ) e Certified Scrum Master pela Scrum Alliance e Facilitador Certificado LEGO® SERIOUS PLAY® (Ver PERFIL).